2 de março de 2009

Homens Sensíveis

Homens que pretendem viver de atividades artísticas têm que enfrentar – além de seus próprios demônios, que são muitos quando se é particularmente sensível – a pressão do sucesso, de realizar as expectativas do papel de provedor. A pecha de não ser adulto, de não ser “homem de verdade” persegue suas escolhas desde muito cedo.

Thiago é músico, roqueiro.
- Ok, você continua na banda, mas faz a faculdade. Qualquer uma. Depois, faz um concurso.
- Não, pai. Eu quero ser músico. Mú-si-co!
- Mas você vai viver de quê, Thiago?
- Ora, pai! Vou viver do meu trabalho!!!

Matheus estuda artes plásticas, pintura.
- Menino, crie juízo! Que vai ser pintor, que nada! Só se for pintor de paredes. Esse curso é para ser professor, professor de Arte. Professor ganha menos do que pintor de paredes.

Bernardo é escritor, poeta.
- Sabe, meu pai me incentivou a ler, a escrever. Desde menino, ele lia Drummond para mim e também Bandeira e Suassuna. Os franceses e ingleses na adolescência, ele é fã de cummings. Ele também escreve. Quando mostrei meus primeiros poemas, ele se emocionou. Encaminhou até para uma editora... Mas agora é esse inferno! Eu quero fazer o vestibular para Letras e ele insiste que eu sou inteligente e deveria fazer Comunicação já que escrevo bem, ou quem sabe Arquitetura porque também gosto de desenhar e posso ser autônomo... Ah, que saco!!!!! Vou me inscrever para Comunicação aqui e sei que não vou passar... Faço vestibular para Letras no Sul e como ele vai preferir que eu faça isso a nada, aproveito e saio de casa.

Uma escolha profissional mais afeita aos gostos ou medos da família é uma estratégia, uma estratégia de fuga. Fugir às vezes custa caro, anos, uma vida.

Daniel é médico.
- Sonho em me aposentar desde o dia que comecei a trabalhar. Não, acho que foi antes... Desde a faculdade. Fiz vestibular para Medicina porque achei que não iria passar. Passei, mas fui um aluno medíocre e logo ingressei no serviço público. Em 30 anos, não fiz nada especial, sou só um burocrata. Agora, completei o tempo para aposentadoria e não sei o que fazer. Eu ainda faço um ou outro desenho, mas não quero ser um artista medíocre. Não posso me aposentar agora.

Escolher segundo as próprias convicções não é negar as expectativas sociais, é testar os limites da resistência a elas. Ser sensível, não significa ser fraco.

José é ator.
Madalena (irritada): Tá, tá, eu entendo, não pintou nenhum trabalho. Mas, veja bem, eu não posso sustentar a casa sozinha. Você tem que arrumar um trabalho fixo. Senão, me separo!
Madalena (sedutora): Aceita fazer aquele comercial, vai... Você pode ser artista na TV... Você fica tão bem no vídeo...
José (firme): Madá, você sempre soube que eu sou ator, ator de teatro. Por princípio, eu não faço comercial nem propaganda política. Você quer mesmo separar por isso?

Ser homem e sensível é, ainda nesses tempos em que o feminismo parece ter alcançado alguma de suas metas, um fardo que homens e mulheres carregam com dificuldade.

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